A mortalidade materna é um dos mais sérios e persistentes desafios de saúde pública enfrentados pelo Brasil. Mais do que uma estatística fria, cada caso representa uma vida interrompida precocemente e uma família marcada por perdas que, na maioria das vezes, poderiam ter sido evitadas com o cuidado adequado.
Proteger a vida da mulher durante a gestação, o parto e o puerpério não é apenas um imperativo clínico, mas um compromisso social e humano que deve mobilizar toda a sociedade.
Segundo dados preliminares da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), em 2024 o Brasil registrou 50,57 óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos. Este número está bem acima da meta nacional para 2030, que prevê a redução para 30 mortes a cada 100 mil nascimentos.
A persistência desses índices elevados revela falhas estruturais no sistema de saúde, desigualdade no o aos serviços e carência de políticas públicas efetivas voltadas à saúde da mulher.
Os fatores de risco para a mortalidade materna são diversos e, muitas vezes, interligados. Hipertensão gestacional (como a pré-eclâmpsia), hemorragias, infecções, abortos inseguros, complicações no parto e doenças preexistentes não diagnosticadas ou mal controladas são causas frequentes.
A esses elementos somam-se problemas sistêmicos, como o atraso no reconhecimento e atendimento de emergências obstétricas, falta de infraestrutura adequada em muitas maternidades e escassez de profissionais capacitados, especialmente nas regiões mais remotas.
Outro ponto que merece atenção urgente é a gravidez precoce. Meninas entre 10 e 14 anos enfrentam uma razão de morte materna 38% maior do que mulheres acima dos 20 anos. Esse dado é alarmante e está frequentemente associado a situações de violência sexual e estupro de vulnerável. Portanto, a prevenção da gravidez precoce não pode ser dissociada do combate à violência contra meninas e adolescentes.
É imprescindível fortalecer políticas de proteção, garantir o à educação sexual nas escolas, ampliar canais de denúncia e oferecer acolhimento seguro e humanizado para vítimas de abuso.
Para reverter esse cenário, é necessário investir de forma decisiva em ações preventivas. O acompanhamento pré-natal de qualidade, com início precoce e frequência adequada, é uma das ferramentas mais eficazes para identificar riscos e agir de forma proativa. Além disso, políticas de incentivo à formação continuada de profissionais da saúde, melhorias na rede hospitalar e campanhas públicas de conscientização podem salvar vidas.
A redução da mortalidade materna exige vontade política, compromisso institucional e envolvimento comunitário. Proteger a saúde da mulher é proteger o futuro de um país inteiro. Que possamos, juntos, construir um Brasil onde nenhuma mulher perca a vida por causas evitáveis durante o momento que deveria ser de esperança e renovação.
Giovana Fortunato é ginecologista e obstetra